Termómetro político: o saldo segue no vermelho
A maré começou a mexer, mas ainda não virou. As últimas leituras da Intercampus, feitas entre julho e agosto de 2025, mostram um governo a recuperar milímetros de espaço na opinião pública, porém ainda preso a um saldo negativo. Em julho, a avaliação do executivo de Luís Montenegro registou 26,2% de aprovação contra 39,6% de desaprovação. Em agosto, a desaprovação recuou para 39,4%, mas a aprovação também caiu, para 25,7%. No fim do dia, o saldo continua vermelho e praticamente estável.
Na prática, o governo ganha algum fôlego com a ligeira descida da rejeição, mas perde impacto porque a adesão positiva também cedeu. O retrato deixa claro um padrão: a sociedade está dividida e, por agora, mais inclinada a penalizar do que a premiar. Não há aqui estado de graça prolongado. E é compreensível: a campanha de 2025 foi dominada por dossiers pesados — habitação, migração, SNS, pensões e salários — que não se resolvem em semanas.
Os números de julho e agosto ajudam a ler a fotografia com mais nitidez:
- Julho 2025: aprovação 26,2% | desaprovação 39,6% | saldo -13,4 p.p.
- Agosto 2025: aprovação 25,7% | desaprovação 39,4% | saldo -13,7 p.p.
Ou seja, pequenas oscilações, sem mudança de tendência. A opinião pública parece estar em modo de espera, a avaliar caso a caso. É o tipo de padrão que costuma reagir a medidas muito concretas: baixar IRS no bolso certo, tirar projetos de habitação do papel e mostrar urgências hospitalares a funcionar melhor. Enquanto isso não tem resultados visíveis, a dúvida pesa mais do que a esperança.
Outro ponto a ter em conta: as sondagens captam o sentimento do momento, e o momento tem sido volátil. Com juros altos, rendas caras e pressão no custo de vida, cada anúncio orçamental ou sinal no SNS move agulhas. A descida marginal da desaprovação sugere menos irritação difusa, mas a queda da aprovação lembra que entusiasmo, por enquanto, não há. Para inverter o saldo, o governo precisa de vitórias tangíveis e comunicáveis.

Parlamento fragmentado e os próximos testes
O contexto político não ajuda. A Aliança Democrática venceu as legislativas de maio com 32,1% dos votos, mas ficou longe da maioria absoluta. O parlamento saiu fragmentado: PS e Chega têm 58 deputados cada, e o governo precisa de somar apoios à direita ou ao centro-esquerda, consoante o dossiê. É a definição de governar com aritmética fina — e com risco permanente de bloqueio.
Essa aritmética conta muito para a percepção pública. Se a agenda emperra, a avaliação degrada; se há acordos cirúrgicos que destravam reformas e orçamento, a aprovação tem espaço para crescer. O PS está a recompor-se depois da saída de Pedro Nuno Santos, o que cria margem e também incerteza: os socialistas decidem caso a caso onde viabilizam, endurecem ou travam. Já o Chega assume-se como peça-chave na direita, mas com linhas vermelhas fortes em temas como migração e segurança, e um discurso que torna negociações mais ruidosas.
Os próximos meses trazem um barómetro decisivo: o Orçamento do Estado. É aqui que medidas com impacto direto — tabelas de IRS, apoios à habitação, reforço do SNS, pensões, investimento público — se materializam. Passar um orçamento em minoria é sempre um xadrez. O governo terá de escolher: abrir porta a entendimento com o PS em matérias sociais e fiscais ou procurar uma geometria variável com a direita, somando partidos ao centro e à direita. Cada opção tem custos e benefícios no terreno da opinião pública.
Nos dossiês de fundo, o mapa é conhecido. Em habitação, o desafio é aumentar oferta e acelerar licenças, ao mesmo tempo que se alivia quem está sob esforço com a renda. Medidas que não mexem em prazos administrativos ou não libertam solo acabam por ter pouco efeito no curto prazo. No SNS, o gargalo é a falta de profissionais e a gestão de urgências; sem respostas para carreiras e contratação, a pressão mantém-se. Em rendimentos, a discussão gira em torno de aliviar a classe média via IRS e manter medidas de mitigação para quem tem salários mais baixos e pensões mínimas.
Em migração, o governo prometeu clarificar regras e reforçar controlo sem fechar portas ao trabalho de que a economia precisa. O tema é sensível e polariza: qualquer deslize tem impacto imediato na tal percepção difusa de competência. O mesmo vale para a administração pública: progressões e concursos travados alimentam frustração em setores-chave, da escola ao hospital.
O comportamento das sondagens tende a responder a três coisas: execução, comunicação e estabilidade. Execução porque é o que muda a vida real; comunicação porque explica o que está a ser feito e com que calendário; estabilidade porque ninguém quer viver ao ritmo de crises parlamentares. O governo tem vantagem se mostrar obra concreta e previsibilidade. Se ficar refém de ziguezagues ou vetos cruzados, o saldo negativo tende a cristalizar.
No plano partidário, a disputa pela liderança do espaço de oposição também pesa. O PS reorganiza-se e define até onde vai na viabilização de medidas económicas e sociais. O Chega mede ganhos ao endurecer posições. Entre estes polos, os partidos menores procuram relevância e moeda negocial. É aqui que nascem as maiorias circunstanciais que sustentam — ou derrubam — propostas.
Do ponto de vista do eleitor comum, a régua é simples: contas ao fim do mês, acesso a médico, casa com renda pagável, salário a acompanhar preços. Enquanto estas caixas não forem marcadas, a aprovação do governo dificilmente dispara. Mas quando uma ou duas mexem, as sondagens mexem junto. A queda suave da desaprovação em agosto mostra que há espaço para reconquista; a baixa da aprovação lembra que a paciência tem limites.
Em suma, o governo está a meio de uma travessia com vento pela proa, mas mar ainda navegável. Precisa de resultados visíveis e acordos sólidos em São Bento. As próximas semanas, com decisões orçamentais e sinais nos dossiês quentes, vão dizer se a curva vira para o positivo ou se a estagnação se instala.