Greve na função pública atinge 80% de adesão; saúde e educação paralisadas
27 novembro 2025

A greve na função pública desta sexta-feira, 21 de novembro de 2025, paralisou serviços essenciais em todo o país, com adesão de cerca de 80% em todos os sectores da administração pública às 11h15, segundo confirmou Mário Rui, secretário-geral da Federação Nacional de Sindicatos Independentes da Administração Pública e de Entidades com Fins Públicos (Fesinap). Nos hospitais e escolas, o impacto foi devastador: no Hospital de São João, no Porto, nenhuma cirurgia programada foi realizada até às 10h da manhã. Na escola básica Conde de Oeiras, em Oeiras, as portas permaneceram fechadas — sem alunos, sem professores, sem sequer o staff de limpeza. Era um silêncio que gritava.

Por que esta greve é diferente?

Esta não foi só mais uma paralisação. Foi uma declaração de guerra contra o pacote laboral "Trabalho XXI". O que está em jogo não é apenas o horário de trabalho ou os salários — é a própria estrutura dos direitos adquiridos. "Mário Rui foi claro: o Governo não quer negociar. Quer impor. E isso é discriminação sindical", afirmou, referindo-se à exclusão da Fesinap das mesas de negociação, enquanto outros sindicatos têm assento. A frustração é profunda. Muitos trabalhadores sentem que foram traídos. "Agora é o nosso turno. Daqui a dez anos, os jovens vão pagar por isso", disse uma enfermeira do São João, que pediu para não ser identificada.

Setores mais atingidos: saúde e educação

Às 09h00, a adesão já estava em torno de 60% na saúde e na educação — e subiu para 80% nas horas seguintes. No Hospital de São João, as urgências funcionavam, mas as cirurgias eletivas foram todas canceladas. Dois pacientes com câncer tiveram tratamentos adiados. Em escolas de Lisboa, Coimbra e Braga, os pais tiveram que improvisar — alguns levaram os filhos ao trabalho, outros recorreram a avós ou vizinhos. "Foi caos total", contou uma mãe de duas crianças na escola básica Conde de Oeiras. "Nem sequer houve aviso. A escola só fechou às 8h30. Fiquei sem alternativa." A Fenprof e a FNAM não só apoiaram a greve — foram protagonistas. A FNAM denunciou "a imposição de bancos de horas, a erosão dos direitos de amamentação e a limitação do direito à greve". A Fenprof, por sua vez, falou em "grave ataque aos direitos dos trabalhadores". Ambos uniram-se à Fesinap, formando um front quase unânime. "Não estamos a pedir favores. Estamos a defender o que já é nosso", disse um professor de Matemática de 38 anos, na frente da escola de Oeiras.

Os serviços mínimos: ilegais, dizem os sindicatos

A Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) impôs serviços mínimos para os serviços sob sua tutela — mas o Sindicato dos Trabalhadores da Floresta, Ambiente e Proteção Civil (SINFAP), ligado à Fesinap, chamou isso de "abuso de poder". "Não foram negociados. Não foram discutidos. São uma violação da Constituição", afirmou um representante sindical. A decisão, segundo ele, visa "assustar os trabalhadores e desmoralizar a greve". É um jogo perigoso. A lei permite serviços mínimos, mas exige negociação. E aqui, não houve. "É como se o Governo dissesse: 'vocês podem greviar, mas só se fizerem o que nós mandarmos'. Isso não é direito. É chantagem", disse ao SÁBADO.

Antecâmara da greve geral de 11 de dezembro

Antecâmara da greve geral de 11 de dezembro

Esta greve de 21 de novembro não foi um fim — foi um sinal. A Fesinap acha que é a antecâmara da greve geral de 11 de dezembro, que já tem 45 organizações sindicais confirmadas, incluindo a UGT e a CGTP. "Será uma das maiores greves dos últimos anos", disse José Abraão, secretário-geral da Fesinap. "E não é só sobre trabalho. É sobre dignidade." A UGT, que antes criticava o pacote laboral, agora consensuou a data com a CGTP — um movimento histórico. Isso significa que, pela primeira vez em anos, os dois maiores sindicatos do país estão alinhados. "A falta de evolução nas negociações foi o gatilho", explicou um dirigente da UGT. "O Governo não respondeu. Não ouviu. Agora, vamos falar com os pés." O Sindicato dos Trabalhadores do Município de Lisboa (STML) também confirmou participação total. "É um retrocesso nos direitos, nas garantias, na vida", disse seu presidente. "Se aceitarmos isso hoje, amanhã não haverá mais direitos."

Por que isso importa para todos nós?

Esta greve não afeta só quem trabalha na função pública. Afeta você. Se seu filho não foi à escola, se sua mãe teve uma cirurgia adiada, se o médico que a atendeu não apareceu — isso é você. O que está em jogo é o modelo de Estado que queremos. Um Estado que protege os seus trabalhadores? Ou um Estado que os transforma em mercadoria? A Fesinap não está pedindo mais dinheiro. Está pedindo respeito. "A proposta do Governo é um ataque não só a quem está agora no mercado, mas às próximas gerações", reiterou Mário Rui. E isso, mais do que números, é uma questão moral.

Como será a greve geral de 11 de dezembro?

Como será a greve geral de 11 de dezembro?

Ainda não há detalhes oficiais, mas os sindicatos já estão se preparando. A expectativa é de uma mobilização nacional, com bloqueios em aeroportos, estações ferroviárias e portos. A Fenprof planeja que professores de todo o país levem livros às ruas. A FNAM quer médicos vestidos de branco, com faixas, em frente aos ministérios. A UGT e a CGTP vão coordenar caravanas de cidades do interior para Lisboa e Porto.

Frequently Asked Questions

Como a greve afetou os cuidados de saúde?

No Hospital de São João, todas as cirurgias programadas foram canceladas até às 10h, e muitas foram remarcadas para semanas ou meses depois. Pacientes com câncer, doenças crónicas e emergências não vitais sofreram atrasos. Os serviços de urgência funcionaram, mas com redução de pessoal, aumentando os tempos de espera. A FNAM alertou que isso pode ter consequências de longo prazo na sobrevivência de doentes em tratamento.

Por que a Fesinap foi excluída das negociações?

O Governo argumenta que a Fesinap tem menor representatividade, mas o sindicato contesta, afirmando que representa mais de 200 mil trabalhadores em áreas estratégicas. A exclusão é vista como política: ao ignorar a Fesinap, o Executivo tenta deslegitimar uma voz crítica. Isso viola o princípio da negociação coletiva, previsto na Constituição e em convenções da OIT.

Quais são os principais pontos da reforma 'Trabalho XXI'?

A proposta permite a imposição de bancos de horas não negociados, flexibiliza horários sob o pretexto de "eficiência", reduz direitos de parentalidade e amamentação, e limita o direito à greve e ao funcionamento sindical. A FNAM e a Fenprof consideram que isso abre caminho para a precarização massiva, especialmente entre jovens e trabalhadores de baixos salários.

A greve de 11 de dezembro pode ser maior que a de 21 de novembro?

Sim. Com 45 sindicatos unidos — incluindo UGT e CGTP pela primeira vez em anos — a mobilização de 11 de dezembro tem potencial para ser a maior desde 2011. A expectativa é de paralisação total em transportes, educação, saúde e serviços públicos. O Governo já admitiu estar "em modo de crise" e pode recuar antes da data, mas até agora, não houve sinal de cedência.

O que os cidadãos podem fazer para apoiar os trabalhadores?

Muitos já estão fazendo: compartilhando informações, ajudando com babysitting, ou simplesmente manifestando apoio nas redes sociais. Mas o mais importante é pressionar os deputados e exigir audiências públicas. A greve não é só dos trabalhadores — é de todos que acreditam que um Estado justo não se constrói com desrespeito aos direitos. A solidariedade real é política.

Existe algum precedente histórico semelhante?

A greve geral de 2011, contra os memorandos da troika, foi a última vez que tantos sectores se uniram. Mas então, o contexto era externo (ajuda financeira). Agora, o conflito é interno: o Governo está a tentar mudar as regras do jogo sem consenso. Isso torna a luta mais profunda — e mais perigosa. Se perderem agora, o Estado público como o conhecemos pode desaparecer.